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Blog do Luiz Sperry

Estudos dizem que vegetarianos têm mais depressão; não se sabe bem por que

Luiz Sperry

12/08/2019 04h00

Crédito: iStock

Quando eu era pequeno, nos anos 80, vegetarianismo era uma excentricidade. Quase não se falava sobre e ao que eu me lembre, a única pessoa vegetariana que eu conhecia era uma amiga da minha mãe, que era seguidora do guru Rajneesh, vulgo Osho. Ademais comia-se carne a torto e a direito e São Paulo ainda tinha mais churrascarias do que restaurantes japoneses.

De lá para cá, comer carne passou a ser um hábito muitas vezes passível de críticas e, além do vegetarianismo, difundiu-se a sua vertente mais radical, o veganismo. Em parte por conta de ser supostamente mais saudável, já que as gorduras saturadas de origem animal são responsáveis por diversas doenças, como infarto e acidente vascular cerebral. Mas também por uma questão ética, já que maltratar e matar os animais para comer é, em última instância, um ato de crueldade.

Hoje em dia o vegetarianismo e o veganismo estão bastante difundidos em diversas culturas, de modo que existem diversos estudos sobre o seu impacto na saúde de uma forma geral. Diversos estudos têm sido feitos para se correlacionar dieta e depressão, e os resultados são, de certo modo surpreendentes.

Ao contrário de que se poderia supor, partindo-se do princípio de "vegetariano/vegano mais saudável que carnívoro", os adeptos de dietas vegetarianas tiveram índices de depressão significativamente maiores do que os seus correlatos carnívoros. Embora alguns estudos não mostrem diferença entre os grupos, nos trabalhos com maior número de pacientes os resultados mostraram aproximadamente 50% mais depressão no grupo vegetariano. Apenas um estudo mostrou menos depressão e ansiedade no grupo vegetariano.

Partindo-se então dessa premissa de que a dieta pode aumentar a chance de depressão, emerge a pergunta: por quê? Não dá para saber ao certo, já que nem sabemos exatamente quais mecanismos são fundamentais para o estabelecimento da doença. Alguns dizem que a carência de certas substâncias, como a creatina, que tem níveis menores em vegetarianos do que em carnívoros, pode estar relacionada a uma alteração no metabolismo cerebral.

Outra possibilidade é o fato das mudanças alimentares provocarem mudanças no padrão da flora microbiana intestinal. Veganos apresentam uma diminuição em algumas populações de bactérias da microbiota intestinal, como Escherichia coli ou Bifidobacterium, enquanto outras permanecem inalteradas. E o que isso tem a ver? Alterações na composição da flora intestinal podem provocar efeitos sistêmicos em outros órgãos, inclusive estão relacionadas à depressão. Mas ainda não podemos dizer qual bactéria exatamente faz qual coisa.

Ou ainda, seguindo um raciocínio menos biológico, mas não menos válido, podemos imaginar que veganos sejam pessoas mais sensíveis e conscientes das mazelas do mundo e exatamente por isso estejam mais propensos a ficar deprimidos.

De todo modo, não é minha intenção dizer coma ou não coma carne. Mesmo no que se refere à saúde mental, há outras áreas de pesquisa que mostram uma vantagem da dieta vegana sobre a carnívora, como no risco de demências. O importante é estar mais atento aos fatos e menos aos boatos.

Sobre o autor

Luiz Sperry é médico psiquiatra formado pela USP em 2003. Adora a cidade de São Paulo, onde nasceu e cresceu. Já trabalhou nos 4 cantos dela, inclusive plantão em pronto-socorro (tipo ER mesmo), Unidade Básica, HC, Emílio Ribas, hospícios e hospitais gerais. Foi professor de psicopatologia na Faculdade Paulista de Serviço Social e hoje em dia trabalha em consultório e supervisiona residentes do HC.

Sobre o blog

Um espaço para falar das coisas psi em interface com o que acontece no dia a dia, trazendo temas da atualidade sem ser bitolado.

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