Você sabe a diferença de impulsividade e compulsão?

Crédito: iStock
Hoje um paciente entrou na sala e disse para minha que tinha muitas compulsões. Como já o conhecia há algum tempo corrigi, dizendo que ele não era compulsivo, e sim impulsivo. Ele rebateu dizendo que era compulsivo sim e acabou havendo uma breve e acalorada discussão acerca dos termos utilizados. O que prova que eu estava certo e ele era, de fato, impulsivo.
Existe uma certa confusão conceitual quando tratamos daquilo que chamamos de compulsão. Muitas vezes estamos na verdade falando de algo que é referente não a uma compulsão, mas a algo relacionado a nossa impulsividade e vice-versa.
Não é uma diferença muito gritante, inclusive as palavras têm uma raiz etimológica comum. Ambas se referem inicialmente a uma alteração do comportamento, ou seja, são coisas que a gente faz. E ambas se referem a atividades sobre as quais nós não temos controle, pelo menos não totalmente. Pode-se dizer que são em alguma instância sintomas de perda de controle.
Mas existem diferenças. Quando falamos de compulsão, a primeira relação que fazemos, e não por acaso, é com o famoso Transtorno Obsessivo Compulsivo. Que é uma doença geralmente composta por uma série de pensamentos obsessivos que causam grande sofrimento (por exemplo "esqueci o gás ligado") que leva a um comportamento compulsivo (nesse caso, checar inúmeras vezes se o gás está ligado ou não). Os pensamentos obsessivos podem ser extremamente variados e muitas vezes bizarros, com rituais muitas vezes longos e detalhados. O banho de um obsessivo pode demorar várias horas, já que para estar realmente limpo (segundo a lógica obsessiva) cada parte do corpo deve ser esfregada um certo número de vezes. Obviamente eles acabam por perder a conta no meio do banho e precisam iniciar o ritual tudo de novo.
Já a impulsividade funciona de uma maneira um pouco diferente. O que chamamos na psiquiatria de Transtornos do Impulso são uma série de transtornos diferentes onde a pessoa sente a necessidade urgente de fazer algo que em geral não é de fato adequado de antemão. São exemplos o Transtorno do Jogo, Impulsividade Sexual Excessiva ou Cleptomania. Pessoas que têm uma tendência a transar demais, arriscam muito no jogo e eventualmente correm o risco de serem presas roubando algo de que não precisam.
O leitor atento talvez já tenha percebido a diferença entre as duas situações. Se não entendeu a gente explica. Quando falamos de compulsão, estamos falando de alguém que está numa postura defensiva, tentando se proteger ou afastar algum risco que lhe parece iminente naquele momento. Importante notar que os obsessivos-compulsivos geralmente tem perfeita noção que esfregar quatro ou cinco vezes dá na mesma, ou que já checaram o gás diversas vezes. Mas são incapazes de conviver com a dúvida e o risco, por mais ínfimo que seja.
Os impulsivos por outro lado não conseguem se afastar do risco. Nesses casos, o risco está geralmente associado a uma grande quantidade de prazer. Mas o impulsivo sabe muito bem que seus prazeres desmedidos são ilegais, imorais ou engordam, de modo que frequentemente são seguidos de um sentimento de culpa intenso e mesmo auto-punição.
Não é sempre que as coisas na vida real são tão bem separadas assim como nesses exemplos. Muitas vezes os sentimentos de culpa, medo e prazer estão presentes em ambos os casos, e tudo isso pode aparecer ainda dentro de outro quadro maior, como uma depressão ou uma crise maníaca. Na dúvida, pergunte ao seu psiquiatra e reze para ele não escrever um textão como eu só para provar que tinha razão.
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