5 estratégias que a mente usa para se proteger em tempos de coronavírus
É como se todo mundo fosse jogado num grande experimento, sem consentimento prévio. Aquilo que nós víamos como algo próprio da ficção – a corrida por mantimentos, as ruas vazias- agora faz parte do nosso dia a dia. As reações não tardam, cada um à sua maneira, tendo que lidar com as duras limitações que se impõe a todos nós. Nosso Ego incansável lança mão de suas armas, a ver.
A primeira está muito evidente para todos. Quando a realidade nos é desfavorável, ela pode ser estranhamente ignorada, como se a potencial ameaça não houvesse. Parte-se então para minimizar o fato como "mais uma gripe", "histeria coletiva" ou o risível "o medo é pior que o coronavírus". Esse fenômeno tem um nome particular. Chama-se recusa. No caso o que está sendo recusado é a própria realidade. É um mecanismo primitivo, muito frequente em casos de psicose ou de perversão. O problema é que ao negar a realidade o sujeito não consegue ter meios para lidar com ela, se afundando cada vez mais no problema.
Uma outra defesa possível, muitas vezes confundida com a recusa é a negação. Na negação, a realidade consegue ser apreendida e internalizada, mas por mais que a pessoa acesse isso, ela não consegue admitir que reconhece o que está acontecido, o que está negado é o sentido daquele objeto. Vamos a um exemplo. "Eu entendo que essa é uma doença muito grave, mas acho que isso tudo serve a um projeto maior e no final será bom para todos!". É até discutível se essa frase é verdadeira ou não, mas a pessoa está tentando lidar, da maneira que pode, com um profundo pavor perante a tempestade que surge no horizonte. Percebe-se que a negação já é algo um pouco melhor que a recusa, no sentido que a realidade não está tão deturpada, e por conseguinte, é mais fácil de lidar com ela.
Está bastante na moda agora a racionalização. "Se todos ficarem em casa agora, mas os serviços básicos funcionarem normalmente a taxa logarítmica de crescimento da epidemia mostra que os casos vão dobrar apenas a cada 72 horas". A análise está correta, mas então qual o problema? O problema é que a racionalização faz com o componente emocional da questão a mesma coisa que a recusa faz com o componente real: apaga. A grande questão dessa epidemia não está contemplada, e ela é: vamos todos morrer? Se não todos, quantos? Os números e probabilidades não têm respostas para isso.
Não podemos deixar de pensar na identificação. Talvez a primeira mudança concreta a se observar nessas primeiras semanas seja um forte espírito comunitário, que a bem da verdade estava cada vez mais difícil de se ver. Em plena Era da Individualidade, estão se formando correntes solidárias potentes de um dia para o outro. Desde ações em grande escala, como a construção de um hospital em Gaza por Israel ou a doação de milhares de equipamentos e mão de obra entre as nações, até situações mais comezinhas, como a revolta popular contra cidadãos que tentam monopolizar bens de primeira necessidade, como álcool gel ou máscaras de proteção. O coletivo está tendo primazia sobre o individual pela primeira vez em muito tempo.
Por outro lado podemos observar que alguns maus sentimentos se afloram, como era de se esperar. A velha mania de botar a culpa no outro pelas nossas mazelas, ligada a um mecanismo que chamamos de identificação projetiva. É um jeito de o Ego exilar de si algo muito cruel ou violento. Se isso está no outro, não pode estar em mim. Ao contrário da identificação, que estabelece um traço de irmandade entre as pessoas, a identificação projetiva marca uma falsa diferença. Aí começa a paranoia, de achar que existe um complô, que é culpa dos chineses e outras imbecilidades do gênero.
Uma boa semana e muita saúde a todos vocês. Fiquem em casa e lavem bem as mãos.
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