Topo

Histórico

Categorias

Blog do Luiz Sperry

Todo mundo é um pouco perverso, mas alguns haters podem ser bem mais

Luiz Sperry

14/05/2018 04h00

Crédito: iStock

Tenho o costume de ler notícias de forma compulsiva há muitos anos. Funciona quase como um transe, correndo os olhos pelas manchetes, sem necessariamente me prender a nada específico. Claro que alguns assuntos, por bem ou por mal, saltam à vista e capturam a nossa atenção por inúmeros motivos. Acabo de descobrir, por exemplo, que Marcelo Valle Silveira Mello foi preso. Ele é provavelmente o mais famigerado hater do país.

Não é a primeira vez que falo disso aqui neste espaço. Só que em geral, associo o hater a um tipo de figura dentro do limite da normalidade que, diante da possibilidade dos meios virtuais, ataca outras pessoas de forma violenta. O caso de Marcelo Mello caminha em outra direção, pois é a história de alguém com um nível de descontrole muito maior.

Apesar de ter sido preso por racismo em 2012, ele foi estranhamente liberado pouco mais de um ano depois.  Atualmente está respondendo processo por inúmeros crimes, como racismo (novamente), ameaças, incitação ao crime e até terrorismo. Já acompanho há alguns anos sua carreira no crime, pois é pública a forma como persegue a blogueira feminista Dolores Arnovitch, do blog Escreva Lola Escreva . Também é notória a incompetência das autoridades envolvidas em impedir Mello de prosseguir com suas perseguições.

Talvez por falta de inteligência ou por arrogância, o hater não costuma disfarçar seus crimes, ou até mesmo se vangloria publicamente deles. Mente, foge e se faz de louco conforme a conveniência. Aparentemente é um herdeiro rico e não trabalha, mas tem recursos para fazer a única coisa que parece lhe dar prazer na vida: causar sofrimento a outras pessoas.

Diferentemente de um hater comum, como as pessoas que eventualmente me atacam aqui no blog, Marcelo vive para isso. Sofre prejuízos palpáveis -foi preso por isso- mas mesmo assim continua de forma descontrolada. Não o conheço pessoalmente, mas parece ser uma pessoa que não consegue ter sociabilidade alguma. Sua maior mágoa é evidente: as mulheres, que não lhe dão o carinho e a atenção que ele acha que merece. Por causa disso, defende abertamente que sejam estupradas ou assassinadas.

Não tenho como dizer o que essa pessoa apresenta em termos diagnósticos, pois diagnósticos psiquiátricos são muitas vezes difíceis e incertos, só podendo ser feitos mediante a entrevistas muito criteriosas. No entanto, posso dizer sem sombra de dúvida que esse comportamento é um protótipo do que a psicanálise chama de comportamento perverso.

A perversão consiste em você realizar o seu desejo, apesar dele passar por cima de regras sociais ou morais já estabelecidas. Daí, temos uma enorme possibilidade de comportamentos que podem ser considerados perversos. Desde matar até estacionar o carro  em uma vaga proibida. Ou seja, a perversão está presente, em maior ou menor grau, no funcionamento de todas as pessoas. E sob certo ponto de vista, até é positiva para o indivíduo, tendo em vista que responder a todas as regras o tempo todo pode ser extremamente sufocante.

O problema é que ela é uma afronta ao que entendemos como civilizado e cultural. E é exatamente por isso que temos a tendência de reagir com um certo asco a comportamentos como os de Marcelo Mello. O que diferencia, como sempre, é a quantidade.

Todo mundo mente um pouco. Mas se você mente, distorce, engana, ataca e lesa o tempo inteiro, provavelmente você é um psicopata, que é o termo coloquial de define o que chamamos hoje em dia de Transtorno de Personalidade Antissocial.

Não tenho como dizer que o acusado, ou as outras pessoas de sua gangue tenham esse transtorno mental. Só penso que, se não tiverem, me parecem estar desperdiçando um talento para isso.

Sobre o autor

Luiz Sperry é médico psiquiatra formado pela USP em 2003. Adora a cidade de São Paulo, onde nasceu e cresceu. Já trabalhou nos 4 cantos dela, inclusive plantão em pronto-socorro (tipo ER mesmo), Unidade Básica, HC, Emílio Ribas, hospícios e hospitais gerais. Foi professor de psicopatologia na Faculdade Paulista de Serviço Social e hoje em dia trabalha em consultório e supervisiona residentes do HC.

Sobre o blog

Um espaço para falar das coisas psi em interface com o que acontece no dia a dia, trazendo temas da atualidade sem ser bitolado.

Blog do Luiz Sperry