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Por que começar a fazer análise? Veja alguns motivos e benefícios

Luiz Sperry

22/04/2019 04h00

Crédito: iStock

Estreou recentemente como colunista da Folha a genial Flavia Boggio. E começou justamente falando de um tema tão próximo do meu dia a dia que nem cheguei a falar dele aqui: o fim da análise. Quando a análise embala de verdade é sempre uma dificuldade terminar; a gente se vale dos mais variados pretextos para poder cair fora. Como ela bem coloca na crônica, parece fim de namoro. Passei por isso diversas vezes enquanto paciente, outras muitas como analista, claro. Mas pensei que talvez mais pertinente seja justamente pensar: quando começar uma análise?

Bem, por análise podem incluir aqui todas as psicoterapias, desde as psicanalíticas, de onde eu falo com mais propriedade, até as terapias cognitivas e behavioristas,  que não são análise strictu sensu, mas são psicoterapia à sua maneira. As pessoas vão procurar uma análise, em geral, quando estão com algum problema na vida. Muitas vezes quando estão doentes, da cabeça ou do corpo. Ou simplesmente quando todos os nossos truques, espertezas, habilidades e afins se mostram insuficientes para resolver todo o tipo de tretas mundanas onde nos metemos.

A análise serve para um monte de coisa. No dizer de Contardo Calligaris: "Serve para diminuir ao mínimo possível o sofrimento neurótico e o sofrimento banal, ou seja, reduzi-los ao que é totalmente inevitável; serve para tentar reorientar ou desorientar a vida da gente –desorientar é uma maneira de orientar! Enfim, serve para tornar a experiência cotidiana muito mais interessante. Pensando bem, quase tudo se inclui nessas três coisas".

Eu incluiria aí também o desenvolvimento de uma série de habilidades tão propriamente humanas, que permitem que a gente consiga tornar nossa existência mais interessante. Não é incomum que a gente reaja às provações da vida de modo um tanto animalesco. E os animais tendem a responder às provações de duas maneiras: ou saem correndo, ou entram numa luta desesperada pela sobrevivência. É luta ou fuga, e essas habilidades persistem no ser humano. Temos um senso de preservação enorme, assim como brigamos mais e melhor que qualquer outro ser vivo que já habitou este planeta. Mas em geral nossa vida fica muito ruim se a gente só consegue brigar ou fugir.

Começa a ficar melhor quando a gente adquire outras habilidades. Fazer alianças, pedir ajuda, ameaçar, blefar, mentir, estabelecer acordos, celebrar, simbolizar, produzir, imaginar, seduzir, convencer e tantas outras coisas são coisas que só o ser humano faz, e é isso que nos torna diferentes dos outros bichos. E a análise é sem dúvida um método fantástico no sentido de desenvolver essas habilidades emocionais.

Claro que tem seus contratempos. Cada dia é mais complicado na logística das grandes cidades, o ir e vir que em princípio a análise exige. É um processo muitas vezes dispendioso e demorado. Mas encerro com um pequeno diálogo que ocorreu certa vez em que fui ao analista. Eu era recém-formado, sem grana pra nada. Ele, um psicanalista renomado, custava os olhos da cara. Não sem constrangimento comentei esse inconveniente. Ele me olhou sério, sem piscar, e disse:

– E o preço de não fazer análise?

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Sobre o autor

Luiz Sperry é médico psiquiatra formado pela USP em 2003. Adora a cidade de São Paulo, onde nasceu e cresceu. Já trabalhou nos 4 cantos dela, inclusive plantão em pronto-socorro (tipo ER mesmo), Unidade Básica, HC, Emílio Ribas, hospícios e hospitais gerais. Foi professor de psicopatologia na Faculdade Paulista de Serviço Social e hoje em dia trabalha em consultório e supervisiona residentes do HC.

Sobre o blog

Um espaço para falar das coisas psi em interface com o que acontece no dia a dia, trazendo temas da atualidade sem ser bitolado.

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