Existe um momento em que dinheiro demais reduz a felicidade: saiba quando
Hoje estava vindo trabalhar e escutei no rádio uma notícia que não me surpreendeu muito. Era um subprocurador da República se lamentando para o procurador geral que o seu salário era baixo demais; a saber, R$ 42.000 por mês. Digo que não me surpreendeu muito porque não é a primeira vez, em tempos recentes, que essa gente vem a público se queixar de seus salários e benefícios infindáveis. Mas por outro lado, algo em mim ficou a se perguntar o quanto um cidadão desses precisaria receber para ficar mais ou menos contente.
Lembrei-me então de um estudo mais ou menos famoso que correlaciona a renda da pessoa à sua felicidade. Foi feito há alguns anos, com dados americanos, mas tive a agradável surpresa de descobrir que havia sido refeito, agora com dados de todos os continentes. É importante ressaltar que estudos que tratam de "felicidade" me deixam um pouco com a pulga atrás da orelha, porque o que se chama felicidade de fato não existe. É uma abstração tão abstrata que não cabe num trabalho efetivo. Prefiro seguir acreditando na máxima que somente uma tartaruga sob o sol sabe o que é realmente ser feliz.
E de fato o estudo é um pouco mais complexo que isso. A chamada "felicidade" é uma medida de bem-estar subjetivo. E esse bem-estar está relacionado a três áreas: sentimentos positivos, sentimentos negativos e satisfação com a vida. Os sentimentos positivos estão relacionados à quantidade de prazer que uma pessoa consegue ter em sua vida, e os sentimentos negativos estão associados ao quanto a gente consegue evitar a dor e o sofrimento. Já a satisfação com a vida é isso mesmo, o quanto você está satisfeito com você, família, trabalho, etc…
Pois bem, quanto mais aumenta a renda da pessoa, maior é a quantidade de prazer, menor a quantidade de desprazer e maior é a satisfação com a vida em suas diferentes dimensões. Mas o ponto que eu acho mais interessante e precioso desse estudo é que a curva não vai subindo para sempre. Existe um ponto onde ganhar mais dinheiro não vai fazer você ter mais prazer ou menos desprazer. Na verdade, ao passar desse ponto, pode-se inclusive piorar a sensação subjetiva de bem estar.
Obviamente que as diferentes dinâmicas econômicas nos diferentes lugares fazem com que a quantidade de dinheiro para se chegar no chamado ponto de satisfação varie bastante. A média global é de US$ 95.000 ao ano (o que dá US$ 7.916 por mês, R$ 34.675 na cotação de sexta-feira). O mais baixo é justamente o da América Latina. Por aqui basta você ganhar por mês a bagatela de R$ 12.275 que você está no auge da felicidade. O mais alto é na Austrália e Nova Zelândia; por lá o salário onde a felicidade é plena seria equivalente a R$ 45.000.
É interessante notar que as dinâmicas regionais influenciam também na percepção de prazer e desprazer. Em geral as curvas de prazer e desprazer chegam ao ponto máximo com uma quantidade um pouco menor de dinheiro. Aqui na nossa realidade, a partir de R$10.950 ao mês não se obtém mais prazer nem menos desprazer. É uma diferença bem pequena, diferente de outros lugares do mundo, onde em geral, mesmo sem se conseguir mais prazer/menos desprazer, ainda assim a satisfação com a vida segue aumentando mais conforme a renda aumenta.
Considerando-se que no Brasil quem ganha acima de R$ 5.200 ao mês está entre os 10% mais ricos, esse salário ideal de R$12.275 não pode ser considerado pouca coisa. Mas não é uma cifra astronômica totalmente fora da realidade. Por isso eu sugiro ao subprocurador, que talvez seja o caso de diminuir o próprio salário. Esqueça esses benefícios, auxílio-moradia, auxílio-paletó. Parece que o excesso de dinheiro está fazendo mal ao senhor. R$ 12.275 é um bom número.
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