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Blog do Luiz Sperry

Maconha pode prejudicar mais do que você imagina, mas o álcool também

Universa

19/03/2018 04h00

Crédito: iStock

Recebi outro dia um link com um texto do Dr. André Malbergier falando sobre maconha. Nele, o autor comentava que frente ao fenômeno do uso cada vez maior de derivados da maconha para fins medicinais, ainda era impressionante a ignorância da comunidade médica e da população em geral sobre o assunto. Concordo em linhas gerais com o Dr. Malbergier, que é, inclusive, um profissional de quem gosto muito e cujo trabalho admiro. Mas o link do texto veio com uma provocação. E o álcool?

Não é de hoje que a benevolência com que o álcool é tratado na nossa sociedade e, consequentemente, pelos nossos governantes, me chama a atenção. O controle é baixíssimo e a indústria de bebidas anda de mãos dadas com o poder. Na última campanha presidencial, a Ambev, maior indústria de bebidas do país, esteve entre os principais doadores de campanha, junto com empresas de fama questionável, como OAS e JBS. Não é de se estranhar que essa histeria anti-drogas que aflige a nação simplesmente se esqueça da principal e mais lesiva delas: o álcool.

Pois bem, voltando à questão da maconha, de fato as pessoas não têm noção dos efeitos lesivos da erva. A começar pelos psiquiátricos. Sabidamente, a maconha aumenta o risco de psicoses, como a esquizofrenia, que é uma doença grave e crônica. Aumenta muito também o risco de depressão ou ansiedade. Dependendo da quantidade e frequência, a maconha lentifica nossas funções cognitivas e nos deixa menos capazes e produtivos, mesmo que tenhamos fumado pela última vez há alguns dias.

Ultimamente, temos percebido que existem outros efeitos lesivos. A "erva natural" pode te prejudicar mais do que você imagina. Pode causar câncer de pulmão, afinal, assim como o tabaco, não deixa de ser fumaça de folha queimada que vai para os seus pulmões. Além disso, os rapazes devem ter um cuidado extra: a maconha parece ter um efeito negativo sobre os seus testículos. O uso de maconha está associado a uma incidência maior de câncer de testículo e também diminui a fertilidade masculina. Sim, Bob Marley teve dez filhos, mas em geral prejudica (imagino quantos ele teria se não fumasse).

O álcool não fica atrás. Está associado a câncer de boca, esôfago, estômago. Além de, evidentemente, causar cirrose hepática e câncer de fígado. Pode causar pancreatite e osteoporose. O uso de álcool está intimamente relacionado ao risco de morte violenta, seja por acidentes de carro, homicídios ou violência doméstica. Aumenta o risco de demências, depressão e pânico.

Não quero dizer que o uso de álcool seja necessariamente melhor ou pior do que o uso de maconha. Depende da pessoa, depende da quantidade também. Mas quero deixar evidente que as causas da proibição de uma e da frouxidão com a qual o outro é tratado não são baseadas em critérios técnicos de saúde. Sempre desconfie quando alguém justificar a proibição com esses argumentos.

Sobre o autor

Luiz Sperry é médico psiquiatra formado pela USP em 2003. Adora a cidade de São Paulo, onde nasceu e cresceu. Já trabalhou nos 4 cantos dela, inclusive plantão em pronto-socorro (tipo ER mesmo), Unidade Básica, HC, Emílio Ribas, hospícios e hospitais gerais. Foi professor de psicopatologia na Faculdade Paulista de Serviço Social e hoje em dia trabalha em consultório e supervisiona residentes do HC.

Sobre o blog

Um espaço para falar das coisas psi em interface com o que acontece no dia a dia, trazendo temas da atualidade sem ser bitolado.

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